sábado, 22 de junho de 2013

Proteste, mas SEM FASCISMO!

As manifestações do último dia 20 atravessaram as fronteiras, não apenas a do Brasil, mas também a da História: os números superaram o Fora Collor. Estudantes e trabalhadores reuniram-se nas ruas do país para dizer: "Basta! Não aceitamos nem mais um aumento! Queremos redução da tarifa e passe-livre já, Brasil!" Em solidariedade, emocionados, estrangeiros se uniram à nossa voz, ao nosso grito. Não há dúvida alguma que a brasileira estava com tantas insatisfações, tantas revoltas contra o sistema acumuladas que não teve polícia nem mídia para segurar.

O povo, naturalmente, culpa o governo pelo descaso. Nada mais justo, pois foi o governo que privatizou o transporte público e o colocou a serviço do lucro de alguns. Tal como ocorreu com a privatização da telefonia e vários outros serviços privatizados, os preços decolaram. Haddad, por exemplo, prometeu em campanha que o aumento não seria maior que a inflação, mas ignorou o fato que o valor atual já está bem acima inflação, e muito acima do que muitos podem pagar. Uma grande contradição: espera-se que a população de baixa renda ande de ônibus. Mas como isso é possível se eles nem sequer conseguem pagar a tarifa para poder trabalhar? E onde fica o nosso direito de ir e vir?

No papel.

O governo não valoriza o trabalhador, mas os patrões. Obviamente, são os patrões que bancam as campanhas salariais dos partidos que governam o Brasil: PSDB, PT, PMDB, PSB, PSD, DEM, PSC... A lista é longa.

E por falar em partidos...

Antipartidarismo

Tem raiva voando pra todo lado por causa da presença de alguns partidos neles, como PSTU, PSOL, PCB, PT... Principalmente o PSTU, que parece ser o partido mais persistente em mostrar para o povo que está nas manifestações. Partidos que sempre estiveram no movimento, que têm a tradição de décadas de levar suas bandeiras. Até mesmo vários partidos menores, a maioria dos quais não se denominam partidos.

Desta vez, entretanto, o povo, inexperiente com os protestos, estranhou. Mais do que isso: escandalizou-se, enraiveceu-se. E partiu pra violência, querem derrubar as bandeiras a qualquer custo. Militantes foram agredidos. E diziam: "Os partidos nos dividem! Queremos o povo unido!" Exigiam a expulsão dos militantes das manifestações.

Hum... A tentativa de eliminar partidos... Isso é fascismo!

Sim, fascismo! Inconscientemente, o povo começa a aderir a uma ideologia fascista. Não é difícil ver de onde essa ideologia vem: da mídia. Sinto dizer, cara leitora, caro leitor, mas a mídia de hoje é a mesma mídia de 1964. Não mudaram nem um pouco. Assim como apoiaram o Golpe Militar de 64 "em defesa da nação, contra a corrupção e contra o comunismo", hoje querem manipular o movimento contra o aumento das tarifas para transformá-lo num protesto contra os partidos e contra a corrupção.

Isso é o que a mídia burguesa, amiga das empresas de transporte público, quer! Eliminar todos os oponentes políticos de cena e, assim, dirigir o movimento, escolhendo suas pautas, suas ideologias e até mesmo quem é ou não aceito dentro dele. É o que ela está fazendo o tempo todo, o velho e manjado algoritmo de dividir para conquistar, já utilizado zilhões de vezes. E, infelizmente, está conseguindo. Mas ainda podemos virar esse jogo. Temos a obrigação de virar esse jogo.

Não abaixaremos as nossas bandeiras!

Corrupção

Não estou dizendo que ser contra a corrupção, por si só, é fascismo. Muito
pelo contrário. Se fosse, seríamos todos fascistas, pois somos todos contra a corrupção. Mas quais medidas serão tomadas? Tornar corrupção num crime hediondo? Então, neste caso, quem serão os políticos a serem condenados? Apenas aqueles que forem julgados. E quais políticos serão julgados?

Todos conhecemos o mensalão do PT, mas o mensalão do PSDB não foi julgado, e pelo visto não será, pois vai caducar... A privataria tucana também não foi trazida à tona (embora o PT também seja perito em privataria).

Quem escolhe quem será julgado? Não, não é o STF. É a mídia. E o povo fica à merce de sua propaganda. Se vamos lutar contra a corrupção, ótimo! Mas temos que ter pautas bem definidas, ou seremos manipulados! Seremos massa de manobra!

Sugiro que nós lutemos, acima de tudo, contra a raiz da corrupção: o financiamento privado de campanhas políticas. Sim! São os políticos financiados pelas empresas de transporte público que aceitaram o aumento da passagem requisitado por elas. O financiamento dos partidos deve ser exclusivamente público, com gastos fixos e definidos para cada cargo. Isso, evidentemente, tem que vir acompanhado do fim da imunidade parlamentar, da redução dos salários dos parlamentares, da revogabilidade dos cargos, da participação popular... Enfim, uma reforma política completa.

Sim! Não sou apenas contra a corrupção, quero uma reforma política completa! Qualquer coisa menor do que isso trabalhará contra nós, não a nosso favor.

Nacionalismo


Até agora, nas manifestações, a grande maioria das pessoas demonstra um nacionalismo inofensivo, sem causa, sem objetivo. O que é nacionalismo? Estamos defendendo a pátria? Mas de quem, se as empresas de transporte são, ao menos em parte, nacionais?

O nacionalismo, por si só, não é inerentemente fascista, mas pode ser utilizado neste sentido. Grupos fascistas e neonazistas afirmam estarem "defendendo a pátria contra os partidos". Muitos dizem: "não levem as bandeiras do seu partido, leve a bandeira do Brasil" ou "antes de ser partidário, você é brasileiro".

Não estamos defendendo o país! Já nos mostra os diversos processos revolucionários do mundo todo: Turquia, Grécia, Síria, Palestina, Egito, Chile, Canadá, Portugal... A nossa luta é internacional! Essas manifestações do Brasil foram inspiradas pela grande explosão de manifestações em incontáveis países no mundo todo.

Esta é uma luta contra a exploração da classe trabalhadora e contra as contradições do capitalismo. Oras, de fato, como pode o mundo produzir cada vez mais e os trabalhadores terem cada vez menor poder de compra? As mercadorias não deveriam, por motivos lógicos, ficarem cada vez mais baratas? E por que as cargas horárias aumentam em vez de diminuir?

E no caso do transporte público, isso é ainda mais evidente. Por que uma passagem de ônibus é mais cara do que dividir a gasolina de um carro entre cinco pessoas? Como pode ser se a quantidade de combustível por passageiro no ônibus é menor? Proporcionalmente ao número de passageiros, um ônibus é muito mais barato que um carro, e um trem ou metrô muito mais barato que um ônibus, tanto em custo de produção quanto do combustível...

Acontece que as contradições do capitalismo existem no mundo todo. Por isso, esta é uma luta internacional. É uma luta (muitas vezes inconsciente) da classe trabalhadora contra a exploração capitalista.

É preciso, entretanto, fazer uma ressalva. O nacionalismo tem um lado progressista, quase sempre ignorado pela esquerda. Nacionalismo é a maior arma contra o imperialismo, contra o controle que ele exerce sobre nosso país. Ainda somos um Brasil colônia. O sentimento nacionalista da população não deve ser combatido, mas tem que se virar contra a exploração de empresas estrangeiras: que elas não levem nossos recursos naturais nem explorem o nosso povo. Queremos um Brasil soberano! Não à entrega do nosso petróleo! Que a Petrobrás e as empresas de transporte sejam 100% estatais!

Devemos ser nacionalistas na medida em que isso nos protege contra os ataques imperialistas ao nosso povo, mas ao mesmo tempo internacionalistas na medida em que isso nos torna solidários com a luta dos povos estrangeiros e apoiadores de suas reivindicações - mesmo que isso signifique entregar alguma filial da Petrobrás em um país estrangeiro, por exemplo.

A luta é uma só!

O avanço do conservadorismo e da direita no movimento é bastante forte. Não à toa usam de violência gratuita contra manifestantes de esquerda e também homossexuais. Querem nos dividir! Querem nos expulsar do movimento! Estão do mesmo lado que a polícia: o lado da repressão. São, com ela, culpadas pelo verdadeiro vandalismo: o vandalismo contra pessoas!

Fora a violência fascista das manifestações! Temos que nos unir! Vamos fazer disputas, sim, mas que seja no campo político (política não no sentido usual, mas no sentido amplo: a disputa de ideias). Não vamos disputar quem pode ou não pode ficar nas manifestações, não vamos levar a disputa ao nível físico. As manifestações são espaços públicos. Então que venha quem é do povo, carregue a bandeira que quiser, mas que jogue fora as bandeiras da violência fascista.

segunda-feira, 8 de abril de 2013

PT, esquerda e direita

Quando eu disse a um amigo "a esquerda ultimamente está em ascensão", ele retrucou que eu estava dizendo besteira, "de onde você tirou isso?" Oras, para mim está óbvio: greves, manifestações, aumento dos mandatos de esquerda obtidos nas eleições (PSTU, PSOL, entre outros), recuo dos partidos de direita (PSDB e DEM). O contra-argumento é que, essencialmente, isso não se traduziu em poder político: o PT foi obrigado a ceder a Comissão de Direitos Humanos e Minorias à bancada evangélica, por exemplo. A perda de capacidade do governo do PT de aprovar projetos de esquerda está evidente em outros exemplos.

O PT é um partido que surgiu da mobilização das massas, lutou contra a ditadura militar e assim construiu seu nome. A partir de certo ponto, começou a aceitar doações de empresas para ter recursos materiais e conseguir se eleger, tornar-se um partido viável, elegível. Obteve, então, apoio de um setor da burguesia - a burguesia interna - e também de partidos políticos de direita tradicional.

O que se tornou o PT, então? Um partido com base de esquerda, mas que ascendeu com o apoio da direita. Seria ele, então, um partido de esquerda que se aproveita da direita para obter conquistas? Outro amigo meu usou a seguinte explicação: o PT distrai a direita com um boi de piranha (por exemplo, um cargo político, ou uma lei à direita) enquanto aprova projetos considerados importantes (como o de cotas raciais).

Mas... Será que não seria justamente o contrário? Será que não é o projeto de cotas raciais que é um boi de piranha para o movimento negro que é base do PT? Podemos reformular da seguinte forma: na hora da verdade, de que lado a balança do PT pende?

A resposta a essa pergunta, na minha opinião, está no primeiro parágrafo deste texto. Estamos numa época de ascensão da mobilização das massas. As discussões sobre opressões (transfobia, racismo, machismo, homofobia) estão ganhando terreno, a consciência de esquerda está ganhando terreno. Partidos de direita tradicional (PSDB e DEM) estão em queda e tiveram que se esconder em partidos de pseudo-esquerda (PSD e PSB). Tivemos a magnífica greve das federais, o Pinheirinho também não passou sem resposta. Quem imaginaria que Feliciano teria reprovação tão grande por parte do povo? Até mesmo setores evangélicos estão contra ele! Esse aumento na mobilização é, em verdade, um fenômeno internacional: pode-se vê-la na Primavera Árabe e na Europa.

E a direita, desesperada, se radicaliza, mostra sua cara repressora (Pinheirinho, cracolândia, USP, etc), homofóbica e racista (através do Feliciano e da revista Veja). Enfim, os reacionários fazem jus ao nome e reagem.

Mas reagem a quê? Oras, reagem à ascensão política da esquerda!

E o PT, porque perde poder político no governo? Oras, porque seu poder político vem majoritariamente da burguesia! Portanto, um poder de direita que cai se a direita achar conveniente. E a burguesia, num momento de ascensão do movimento de massas, tende a querer radicalizar-se, ir à direita, para evitar derrotas políticas. Mas não abandonam o PT, afinal, o povo, tendo-o por referência, acreditará no governo que leva o seu nome. Um governo que, no fundo, não é seu, afinal, é a burguesia que se aproveita deste partido e não o contrário. É o feitiço que se vira contra o feiticeiro: o PT, que queria usar a direita para seus propósitos, no fim, acaba sendo por ela usado.

É a contradição do PT que o corrói por dentro e que o leva à direita contra a vontade de sua própria base, dos próprios petistas que são de esquerda!

A Convergência Socialista, antiga corrente do PT, percebeu esta contradição e abandonou o partido, fundando o PSTU. A fundamental tese deste partido sobre o PT parece-me, portanto, ter sido comprovada pela práxis, pela realidade, não apenas pelo caráter dos projetos que ele aprova, mas principalmente devido a essa comprovação da verdadeira origem de sua força política.

Como dizia Marx, existe ideia e existe matéria. O PT tem um programa e um nome de esquerda, tem programas políticos que se pretendem esquerda. Mas isso é só ideia. A matéria, a base material do seu poder político, ou seja, o financiamento e os partidos aliados, são de direita. Como dizia Marx, a ideia pode mudar a matéria, mas a matéria predomina sobre a ideia. A base deste partido disputa o PT num cabo-de-guerra com a burguesia, mas, sem base material, acabam perdendo. Para que a ideia tenha efeito sobre a matéria, é preciso que esta forneça condições para sua aplicação.

Mas o debate sobre idealismo versus materialismo, embora extremamente essencial, fica para outro texto :)

quarta-feira, 20 de março de 2013

Por uma candidatura de esquerda para reitor na Unicamp!

No primeiro turno da consulta para reitor na Unicamp, tínhamos quatro candidatos. Todos eles de direita, todos eles pretendem seguir em frente com o projeto de privatização e elitização do governo do PSDB, saudando a meritocracia, fechando a universidade para quem está do lado de fora, dificultando a integração social entre estudantes, seguindo em frente com a proibição de festas e com a segurança "patrimonial" (não, querida leitora, para a reitoria, o "patrimônio" da universidade não são as pessoas, é todo o resto). Nenhum deles agitou a bandeira da paridade e das eleições diretas para reitor, a da isonomia salarial já, o fim da terceirização ou cotas já. Ninguém criticou as condições subhumanas dos trabalhadores da unicamp, nem as punições do ano passado. Ainda assim, agora no segundo turno, existe uma mobilização bastante grande entre estudantes chamando voto crítico ao Tadeu. Há dois motivos.

Tadeu não puniu, Costa puniu

Primeiro, o outro candidato, Mário Saad da chapa "Unicamp no caminho certo", representa continuação do reitor anterior, o Fernando Costa, que suspendeu cinco estudantes por seis meses. enquanto o segundo, Tadeu Jorge, da "Unicamp de todos os saberes", não puniu estudantes durante sua gestão, embora tenha havido grandes manifestações em 2007.

Isso, entretanto, é desconsiderar todo o contexto. Em 2007, houve uma ocupação na USP que fez com que Serra voltasse atrás com seu decreto, ainda que de forma parcial. A moral conquistada com isso foi tão grande que mais de 50 reitorias pelo país inteiro foram ocupadas. Na ocupação da reitoria da Unicamp, Tadeu iniciou um processo de sindicância contra cinco estudantes, mas decidiu não puni-los. Óbvio, isso seria suicídio político.

Fernando Costa, por outro lado, mesmo contrário ao estatuto da Unicamp, esperou mais de um ano para aplicar as cinco punições com respeito a uma ocupação na Moradia no começo de 2011. Ou seja, esperou as condições políticas favoráveis às punições: os acontecimentos na USP e toda a repressão do governo do Estado.

É extremamente complicado reduzir a diferenciação entre duas candidaturas ao nível pessoal: um é bonzinho e o outro é mau.

Diferença de discurso

Saad tem um discurso aberto de extrema direita enquanto Tadeu tenta parecer mais democrático, aberto ao diálogo. Numa chamada ao voto crítico no Tadeu na segunda-feira, que foi em forma de debate, um dos professores na mesa disse: "Os dois candidatos nasceram iguais, mas sua história os diferenciou." Isso eu concordo, embora ele estava argumentando que Tadeu seria mais brando que Saad e nisso eu discordo.

A história de fato os diferenciou, eles não são candidatos iguais. Eles são bem diferentes no discurso. Tamanha é a diferença de discurso que Tadeu, de direita, é capaz de captar voto e apoio críticos da esquerda! Mas uma diferença de discurso não significa diferença de conteúdo! Por exemplo, Tadeu é a favor da democratização. Por outro lado, não é a favor da paridade nem das eleições diretas e diz: "Mas podemos discutir esse assunto". Discutir como? Seria algo do tipo "Você dá sua opinião e eu dou a palavra final?"

Ele diz que instaurará uma estatuinte universitária, mas como, quando, onde? Pelo tanto que ele falou sobre isso, a estatuinte universitária pode ser ele discutindo com o vice quais seriam as alterações no estatuto! Onde está o "demo"  da democracia? Onde está o "di" no diálogo? Ele leva o discurso à esquerda, mas apenas até onde ele sabe que consegue voltar! Ele é um demagogo, um oportunista!

Voto nulo? Mas...

Diante desta situação, fica-me evidente que a melhor solução é a chamada ao voto nulo, pedindo que haja paridade e eleições diretas. O voto nulo, ao contrário da abstinência, demarca presença e insatisfação com todos os candidatos. Enquanto a abstinência é dizer "eu não ligo para as eleições", escrever "por eleições diretas e paritárias já" na célula significa dizer "eu não reconheço a legitimidade desta consulta, quero uma eleição democrática de verdade!"

Entretanto, gostaria de deixar aqui meu desapontamento aos professores de esquerda que estão chamando voto crítico no Tadeu. Eles disseram que não havia condições para criar uma candidatura de esquerda. O que isso quer dizer? Que tal candidatura não venceria? Nisso eu concordo, afinal, quem decide as eleições são os professores. Mas e daí?

Uma candidatura de esquerda estaria em uma posição privilegiada nos debates para perguntar ao Saad:

- A Unicamp está no caminho certo? E quanto às punições autoritárias e arbitrárias aos cinco estudantes no ano passado? Inclusive com um processo na ausência de um desses estudantes, que estava hospitalizado, desobedecendo a própria constituição, segundo a qual todos têm direito a participarem em sua própria defesa, seja em julgamentos judiciais ou extrajudiciais! Uma punição desumana, que levou o pobre estudante ao suicídio!

Também poderia perguntar ao Tadeu:

- Você disse que é a favor da democracia e do diálogo e também disse que pretende instaurar uma estatuinte universitária. E aí, você vai chamar assembleias pra isso? Ou melhor, um congresso? Vai convocar estudantes, funcionários e professores para discutir essa questão? E já que você disse que podemos conversar sobre paridade, que tal levarmos essa questão também para o congresso?

Tal candidato teria, sem dúvida, apoio do Coletivo Pra Fazer Diferente, da gestão do DCE, talvez até da Juventude às Ruas e de todo o movimento estudantil! Até mesmo dos que apoiam o Tadeu criticamente. Se as chapas para o DCE conseguiram obter, no total, os votos de 30% dos estudantes, e todas elas apoiassem uma candidatura de esquerda, venceríamos, sim, de lavada entre os estudantes.

Idem entre os funcionários, teria apoio do STU e até das chapas de oposição.

Mas, limitados pela visão de uma "candidatura possível", perdemos uma oportunidade histórica de constranger politicamente quem quer que fosse o vencedor dessas eleições por ter perdido entre estudantes e funcionários. Em vez de agitar as bandeiras do "voto no menos pior" ou do "voto por paridade", estaríamos agitando a bandeira da nossa concepção de universidade pública, gratuita e de qualidade, contra as opressões, democrática, aberta, inclusiva.

Se vamos vencer, partimos pra luta. Se vamos perder, partimos pra luta. E se não podemos vencer devido à falta de democracia, mas podemos ter o apoio do povo, então vamos à guerra!

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Minha compreensão sobre religião 1: Alienação?

Como estou acostumado a discutir com pessoas com várias opiniões diferentes pela Internet, já encontrei muitas visões diferentes acerca do que é religião, quais seus males e benefícios, e sobre secularismo. Apesar de tantas opiniões, ainda não encontrei nenhuma reflexão profunda acerca do problema ético: o que na religião é bom e o que é ruim? Após vários estudos e discussões, ainda não julgo ser capaz de responder esta pergunta por completo e definitivo, mas ao menos acredito ter alcançado um começo de resposta.

Uma afirmação bastante comum é que a religião é intrinsecamente má. Dizem que a religião é um instrumento de alienação das pessoas, fazendo-as crer em coisas imagináveis e absurdas, muitas vezes perniciosas, o que tende a levá-las a um comportamento fanático, intolerante. Embora haja algum mérito nesta afirmação, ela não é verdadeira e acredito que a melhor forma de demonstrar isso é analisando o cristianismo primitivo.

Os evangelhos do Novo Testamento (em especial os três primeiros), quando entendidos em seu devido o contexto histórico, revelam forte conteúdo político contra o Império Romano. No século I, sempre que se falava em reino, entendia-se implicitamente que era o Império Romano. Nos três primeiros evangelhos, Jesus pregava dizendo que o Filho do Homem viria logo dos Céus para estabelecer um novo reino, o Reino de Deus, um reino justo em que fariam parte os pobres e oprimidos. Seguindo o óbvio raciocínio lógico, o Império Romano não era um reino justo, o imperador não era um imperador legítimo e ambos seriam destruídos e substituídos por Deus. Entre os ricos da Galileia e da Judeia estavam os romanos, os sacerdotes do templo (que tinham ligações políticas com os romanos) e os cobradores de impostos.

Outro exemplo bastante notável é o incidente no templo em Jerusalém, onde Jesus derruba as mesas de alguns cambistas, evento que, sem dúvida, eventualmente o levou à morte. O comércio no templo era exatamente o que sustentava a vida luxuosa dos sacerdotes e os impostos que eles pagavam aos romanos para que estes garantissem o "bom funcionamento" do templo. Tal bom funcionamento incluía impedir que pessoas "impuras" ou "pecadoras" segundo a lei judaica entrassem no templo. Levando isso em consideração, os milagres de Jesus, seu questionamento à ideia de impureza (Mateus 15:1-20) e sua aceitação aos pecadores ganham um novo significado.

Muitas pessoas duvidam da existência histórica de Jesus por "falta de evidências" e, na minha opinião, elas estão equivocadas, mas isto é irrelevante para este texto. O que importa é que tanto o cristianismo quanto estes evangelhos existiam no século I.

A maior evidência desta forma de compreender o cristianismo primitivo é a carta do governador Plínio, o jovem, ao imperador Trajano. Vejamos alguns trechos dela:

Senhor:
[...]
Esta foi a regra que eu segui diante dos que me foram deferidos como cristãos: perguntei a eles mesmos se eram cristãos; aos que respondiam afirmativamente, repeti uma segunda e uma terceira vez a pergunta, ameaçando-os com o suplício. Os que persistiram mandei executá-los pois eu não duvidava que, seja qual for a culpa, a teimosia e a obstinação inflexível deveriam ser punidas.
[...]
Os que negavam ser cristãos ou tê-lo sido, se invocassem os deuses segundo a fórmula que havia estabelecido, se fizessem sacrifícios com incenso e vinho para a tua imagem [...] e se [...] amaldiçoavam a Cristo [...] achei melhor libertá-los.
[...]
Outros [...] haviam sido e depois deixaram de ser, alguns há três anos, outros há mais tempo, alguns até há vinte anos. Todos estes adoraram a tua imagem e as estátuas dos deuses e amaldiçoaram a Cristo, porém, afirmaram que a culpa deles, ou o erro, não passava do costume de se reunirem num dia fixo, antes do nascer do sol, para cantar um hino a Cristo como a um deus; de obrigarem-se, por juramento, a não cometer crimes, roubos, latrocínios e adultérios, a não faltar com a palavra dada e não negar um depósito exigido na justiça.
[...]
O assunto parece-me merecer a tua opinião, principalmente por causa do grande número de acusados.

O cristianismo, portanto, cresceu e tornou-se um inconveniente para o Império Romano. Esta carta evidencia o que incomodava tanto o imperador no cristianismo: a desobediência e a rejeição da divindade do imperador. Afinal, uma dominação militar e política requer também uma dominação ideológica, dominação à qual o cristianismo (entre outras crenças não romanas) era uma ameaça.

Há, entretanto, um detalhe que não pode ser ignorado: a arma usada pelo Império Romano contra as religiões ideologicamente contrárias a ele era a religião romana! Assim, vemos aqui a religião tomando dois papéis distintos e contraditórios. A religião romana era usada como instrumento de alienação e dominação ideológica pelo Império. Ela desempenhava o papel de justificativa: se o imperador era um deus, então tinha o direito de dominar os outros povos. O cristianismo primitivo, por outro lado, era uma arma de ninguém que Roma não conseguia controlar, diversificado, capaz de adaptar-se às diferentes culturas e épocas, criado pelo próprio povo.

Um instrumento contra a alienação! Ou ao menos contra a alienação de Roma.

Mas, no fim das contas, o Império Romano venceu. Para isso, ele usou o próprio cristianismo. Como diz o ditado, se não consegue derrotar o inimigo, una-se a ele. Foi isso o que Constantino fez com o cristianismo, que se tornou seu eficiente instrumento de dominação ideológica. Surge, então, uma nova Igreja Católica, o cristianismo regularizado e padronizado pelo Império Romano. Todas as questões organizativas deveriam passar por Roma. Foram feitos concílios para que houvesse uma única crença cristã, o que eventualmente levou à canonização dos livros aceitos. Afinal, um único império, uma única crença. Esta padronização atingiria o seu ápice na Idade Média, com a institucionalização da perseguição aos hereges, a proibição de livros e de disseminação de crenças pagãs.

Durante toda a Idade Média, o catolicismo funcionou como arma ideológica para a manutenção do poder dos reis e até dos senhores feudais. Afinal, segundo a crença católica, "todos os líderes são escolhidos por Deus e devem ser obedecidos". Os reis têm o direito divino de governar, são sempre bons e justos. Esta ideologia é ainda hoje vista em desenhos, contos de fadas e filmes: um rei só pode ser mau ou injusto se não for o legítimo herdeiro do trono.

Continua...

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Boa noite, Corujinha...

Há muito tempo não poetizava, mas não pude evitar que sua morte injusta matasse também a mim. Corujinha, ainda que não seja parente nem conhecida, minha homenagem deixo-lhe aqui.
Faz meio ano que ouviu o inconcebível de tua própria mãe. Inconformada  com sua autonomia em escolher sua própria descrença, quis expulsar-lhe de casa. Sabendo que é uma menina, cutucou-lhe na ferida que mais dói, a ferida aberta do machismo. Chamou-a de puta. "Se vais ao diabo, vai com ele à zona! E que cobre apenas a merda que vale!" Sua própria mãe... Posso apenas tentar imaginar sua dor.

Posso tentar, mas fracassarei. Não posso imaginar como sentia o preconceito por ser bipolar, bissexual, ateia e menina. Das minorias, estava em quatro! Quantos de seus próprios companheiros hoje dizem: "Fraca!", pois também não podem imaginar como era vestir a sua pele.

Preocupada não apenas com o fanatismo religioso da qual era vítima, mas também com a falta de bondade nas pessoas, com os problemas do mundo e com a política. Preciso dizer, duvido de muitas das suas ideias, mas não posso duvidar de sua intenção, de sua inocência. Não posso duvidar do seu coração, menina. Nem mesmo aqueles que condenavam seu ateísmo disso são hoje capazes. Dizem que agora você está com Deus. Essa é a linguagem que eles usam para dizer que não a condenam, não poderiam. Se não a respeitavam em vida, ao menos na morte respeitam.

Mas, triste, ainda não lhe respeitam, não respeitam sua memória, sua liberdade. Fizeram questão de invadir seu Facebook, excluindo tudo o que lembrava a todos que era ateia. Links, páginas, retiraram até mesmo sua declaração no seu perfil "Religião: ateia". Querem apagar de você sua personalidade, aquilo que você mesmo construiu. Querem lembrar de você como alguém que você não era, pois para eles é muito doloroso lembrar de você.

Não bastasse, fazem de sua morte uma arma política contra aquilo em que você acreditava! Aproveitam sua morte para dizer a nós, ateus, que cultuamos o mal! Alienígenas, adoradores do diabo, ah, se somos! Levamos a pobre Corujinha à perdição! Dizem aos pais que vigiem seus filhos, para que não se percam como você. Nem mesmo agora conseguem ver a trave no próprio olho!

Você era ateia, dizem eles, e era boa. Mas, claro, era a exceção, só podia ser! Seu ateísmo era apenas uma fase, adolescência, revolta, influência dos maus amigos. Estava apenas buscando a Deus, mas não conseguia achá-lo, então se zangava. Quantos de nós não ouvimos a mesma coisa? É evidente, existe um manual: "O que dizer para um querido quando descobrir que ele é ateu". É com certeza um best-seller mundial. Pois nós, de todos os lugares, ouvimos as mesmas frases.

Nem sequer lhes ocorre que talvez, só talvez, não encontramos a Deus porque ele não está em lugar algum! Nem conseguem imaginar que talvez Deus não se deixe encontrar porque esta talvez seja sua própria vontade. Homens vãos, medrosos do desconhecido, por que razão Deus, existindo, detestaria os ateus como vós? Por que ele teria o ateísmo como inimigo ou perverso?

Não tem nada a temer, minha jovem, pois até mesmo Deus lhe daria razão!

Descanse, por fim, deste mundo tão cheio de intolerância e reações inflamadas ao que tem medo. Se apenas ele percebesse que você tinha muito mais razão para temê-lo do que ele a você! Mas, feito um menino assustado, chutou, pisou, esmagou-lhe. E você, pobrezinha, não aguentou o sofrimento, não poderia, minha flor.

A você, minha querida Corujinha, dou-lhe um beijo de adeus e de boa noite. Durma em paz, mas, por fim, peço-lhe que não sonhe. Deixe seus sonhos aqui.



http://www.paulopes.com.br/2013/01/suicidio-de-militante-ateista-repercute-no-facebook.html

http://www.facebook.com/robertabaetahomenagem
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